Itapecerica da Serra,
da Mata, dos carros, de quem?
Pensar em Itapecerica da Serra é
ter em mente que a vida se resume a escolhas, porém elas estão atreladas a
formas como fomos educados a ver o mundo e interagir com ele. Nossa formação nos dá condições de fazê-las e
geralmente, para alguma menina ou menino, que anda pela rua e olha para os
lados, veem ruas, carros, lojas, casas, escolas, etc e se pergunta que mundo é
este que eu vivo? Participo de sua vida cotidiana? Ajudo a manter tal estrutura
ou posso sugerir novas possibilidades de intervenção no cotidiano? Então
lembramos rapidamente que de novo o tema educação vem como uma martelada em
nossa crítica, nossos pais nos fizeram entender que devemos crescer ir para a
escola e nos formar em uma profissão para ganharmos dinheiro e podermos comprar
tudo o que quiséssemos principalmente aquele belo carro. Nossos amigos também
cresceram assim e na nossa conversa também o sonho é pelo carro ou por um novo
celular. Entramos na escola e como num continuo de formação, ela também nos
ensina a ter expectativas de crescimento, formação, emprego e assim vamos
comprar o carro, a moto, o celular, dinheiro para a balada, Uhuu!! Assim nos tornamos
adultos. Pensa que é só isto, não! A televisão, o rádio, enfim tudo, também nos
ensina a pensar assim, nos forma em consumidores e muito bem formados, diga-se
de passagem, pois sabemos do código de defesa do consumidor, mais não sabemos
da constituição federal. Acho que já dá para falar de outro problema que tem a
ver com as escolhas a que não conseguimos fazer no início desta nossa conversa.
O problema agora é sobre nossa casa, está velha e já tem 5 bilhões de anos,
mais a danada se renova constantemente, quem a ajuda a se renovar? Eu faço
pouco por ela e meus companheiros também, as outras pessoas ainda nem
reconheceram sua importância. Não, não posso afirmar isto. Ainda existem muitos
grupos que compreendem o funcionamento da nossa casa e talvez possamos ouvi-los.
E é o que eles mais fazem também. Os nativos de nosso país e de outras partes
do mundo (somos também descendentes deles, mais nos esquecemos rápido disto)
ouvem e se sentem parte da casa. Aqui vocês já devem imaginar que a casa é o planeta
Terra. Eles sabem que o planeta está vivo, seus rios pulsam vida, como o sangue
pulsa nas artérias, Suas matas renovam o clima e libera o milagre da chuva,
seus mares libertam o oxigênio que é o fôlego do “anima”, suas terras realizam
o milagre do pão. Os nativos se identificaram como parte desta teia onde todos
os seres colaboram para a sobrevivência de um. Como disse Daniel Munduruku, em
seu livro “Sobre piolhos e outros afagos”; “Cada coisa criada está em sintonia
com o criador e que cada natureza, inclusive o homem, precisa compreender que
seu lugar na natureza não é ser senhor, mais um parceiro, alguém que tem a
missão de manter o mundo equilibrado, em perfeita harmonia para que o mundo não
despenque de seu lugar”. Voltamos assim ao início do texto, as escolhas que
faço hoje estão viciadas por um sistema que me formou consumidor e não ser vivo
do planeta Terra, quer dizer que não tenho muitas opções. Na verdade da maneira
que nos educaram não muito e precisamos primeiro nos despir da cultura e da
forma como lemos o mundo. Como fazer isto? Esta questão não dá para responder
em um único texto e nem se concentra em uma única pessoa, esta em muitas novas
formas de propostas de reconhecimento do mundo e de intervenção nele. Pensar
que este modelo que está ai não é o ideal já é o primeiro passo, o segundo é
pensar que as alternativas devem também incluir a todos e não só alguns. Viver
Itapecerica da Serra é ter em mente tudo isto, pensar que minha educação não me
permite compreender e valorizar a manutenção das florestas tão ricas que tem e
me perguntar de porque não podemos ter o mesmo desenvolvimento econômico que
Taboão da Serra tem. Viver em Itapecerica me faz ficar preso no dilema entre
aumentar o número de estradas e
preservar extratos de Mata Atlântica. Viver em Itapecerica me faz pensar
que a lei de preservação de Áreas de Proteção de Mananciais é injusta e ela
deve ser flexibilizada para atrair empresas e gerar empregos. Viver em
Itapecerica é ter em mente que estes problemas são respondidos de acordo com
minha forma de ver o mundo. Pois bem as cartas estão abertas e vamos agora as considerações;
Se por um lado temos o problema de geração de renda, transito caótico, bairros
irregulares, criminalidade, falta de lazer, Falhas na saúde pública, escolas precárias (na formação, e na infraestrutura),
também temos o que sobrou da Mata Atlântica dos últimos 520 anos de exploração
de seus recursos, temos a maior biodiversidade por metro quadrado do planeta,
geramos 50% da água doce que a Cidade de São Paulo bebe e contribuímos com a
manutenção do clima da Região Metropolitana da Grande São Paulo, e ainda a presença das áreas de várzeas que são
locais naturais de despoluição do esgoto residencial. Ainda não aprendemos que podemos tirar destas
verdades, recursos para nossos problemas como indicaremos a seguir. Por
exemplo, o ecoturismo, que permite uma maior distribuição de renda já que
pessoas de poder aquisitivo maior, oriundas geralmente de centros urbanos
deslocam-se para locais mais pobres aquecendo o comércio e pressionando no
crescimento de postos de trabalho. Como
exemplo a Embratur divulgou que no Brasil , a Região Sudeste envia 15,2% da
receita total do turismo para a Região do Nordeste. O turismo é o setor que
apresenta melhor expansão no mercado mundial. A atividade foi considerada o
maior negócio do mundo, responsável por 10% do PIB mundial, considerando seus
impactos indiretos. A cada 10 empregos gerados, um é na área de turismo. O
turismo vem aumentando devido ao fato de as pessoas terem melhores condições de
vida que incluem; acesso a mecanismos de cultura, diminuição das jornadas de
trabalho, a delícia de entrar em contato com novas culturas e lugares e o
reconhecimento do lazer na melhora da qualidade de vida. A visão de que meio
ambiente não gera riquezas deve ser superada pelas razões já descritas acima e
também pelo fato de que as leis e incentivos fiscais permitem a geração de
alternativas econômicas viáveis para as cidades que precisam se adequar a sua
vocação, que no nosso caso é a de ser guardiã da biodiversidade. Deste modo
temos uma série de ações que poderiam ser implementadas pelo poder público e
privado, tais como:
ICM´s ecológico – repasse par aos
municípios que possuam áreas de proteção ambiental e outras formas de
preservação
Lei municipal de incentivo a
cultura – que através de incentivo fiscal a empresa apoia projetos culturais na
cidade
Compensações financeiras
previstas em lei (Lei Preservação de Mananciais artigo 38 de 1997 e na Lei Específica
Guarapiranga de 2006)
Áreas destinadas a sequestro de
carbono (cotas podem ser comercializadas no mercado de carbono – bolsa
mercantil de futuro)
Incentivo a criação de RPPN
(Reservas Particulares de Proteção Natural) no municio e gerarem renda com o
ecoturismo
Isenção de Imposto para
propriedades que garantam serviços ambientais como RPPN e Áreas relacionadas ao
seqüestro de carbono
Feira solidária – trocas de
serviços e produtos – garantindo uma nova forma de ver o mundo e a produção de
bens.
Ecoturismo em espaço público e
privado – Uma das cinco principais formas geradoras de receitas na economia
mundial. Em países em que sua contribuição ultrapassa 2% do produto interno
bruto (PIB), ela passa a ser considerada um segmento sólido e confirma para o
desenvolvimento econômico nacional (Cadernos de Educação Ambiental – Secretaria
do Meio Ambiente do Estado de São Paulo, 2010)
Circuito de plantas ornamentais e hortifrúti – feiras aos finais de semana e rota a ser construída com os
sitiantes produtores, abrindo seus espaços para o turista
Eventos esportivos ligados ao
meio ambiente – colocar o município no circuito de Mountain bike, locais de
avistamentos de aves (birdwatching), setor que atrai público inclusive
internacional e corrida de aventuras
Criar mais áreas de lazer e
preservação pública e privada
Ampliar a rede hoteleira e
melhorar o transporte público para a região.
Fortalecer Apoiar o artesão e
artistas da região em suas sociedades e representações
Fortalecer os departamentos de
Cultura, Esportes, lazer e Meio Ambiente para integrar e propor ações efetivas
na dinâmica da cidade
Ampliar este discurso para os
bairros mais afastados e para os municípios irmãos.
Pensando assim é pensar na
construção de uma nova cidade e na possibilidade de alterar o cotidiano de
forma plena e como cidadão planetário
Davi Perez de Carvalho
Professor de Biologia e Ciências